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domingo, 9 de novembro de 2014

lástimas

Eu vou me mandar daqui, meu bem.
Eu falo sério,  tão sério como uma louca desvairada decidida a deixar sua cama branca no hospício e lutar contra a prostração da alma e se arrastar até o refeitório para tentar conseguir um café com cafeína dessa vez.
 Eu vou fazer minha mala cheia de lenços,  com algum batom vermelho e dois cigarros.
Um pro adeus e outro pro até nunca mais.
Eu vou desafiar o espelho e vou dar cem mil tapas no meu próprio rosto, até marcar, até sangrar, até anestesiar a angústia e esquecer lástima por lástima de uma vez por todas.
Vou mergulhar na areia da praia, completamente bêbada, definitivamente decidida a não mais voltar
Vou contar as estrelas do imenso céu de Ipanema
Vou rir pra cada uma delas e de todas, nenhuma vai lembrar você.

Ah eu queria ir hoje mesmo
E deixar tudo isso pra lá
Mas eu queria tanta coisa, deus do céu,  eu queria tanto
Mas como posso se não posso nem ao menos levantar os quadris
A dor do trauma esfola o coração velho
O sangue corre fosco e escuro
Eu queria dominar todas as tempestades das quais me submeto
Eu queria pelo menos conseguir conviver junto com esse fantasma assombroso e inerte, que arrasta os chinelos pra lá e pra cá no corredor em cada noite de insônia.
Hoje eu odeio você.

quarta-feira, 5 de novembro de 2014

Agosto: desgosto.

Nem é tanta coisa assim.
Só agora, depois de muito esfregar os olhos, é que vejo a coisa como um todo. Um emaranhado de nós, fios e fios se entrelaçando sem nunca denunciar onde é que está a ponta da primeira linha. Onde é que se rompeu e se entrelaçou novamente a corda. Remendos em cima de remendos, um livro inteirinho sem capítulos, daqueles que a gente se perde fácil...
Não é tanta coisa assim, é só uma... é essa coisa imensa que não cabe mais dentro de mim.
Sinto que eu deveria sentir amor, mas no lugar disto, apenas desespero.
 Desespero esmagador, no choro mudo e no soluçar violento, na cara rubra e na pele quente, no calafrio e no medo...
Sabe, meu bem... a verdade é que já não suporto mais entediar-te  tanto assim. Não suporto essa injustiça e eu morro um pouco todas as vezes que vejo a sua juventude escoar junto a minha pia cheia de louças...
 São nesses dias que essa sombra imensa se ergue na parede e me segue tão feroz, tão inabalável, como é que se escapa da sombra, pior ainda, como é que se escapa da própria sombra??
Se na luz meus medos ficam ainda mais expostos... pelo menos no escuro não vejo.
E se eu conseguisse fazer muita força, uma força capaz de mudar o mundo, capaz de reverter todas as coisas ruins... ah
Mas daí não seríamos nós.

Tinta de pele

O seu coração tropeça no descompasso do próprio samba, escuro. Porém,  sua respiração é capaz de me fazer imaginar o repouso dos anjos... Não que isso signifique muito. Nós sabemos que uma mente barulhenta não descansa, mas comete desvairos, imagina vertigens e você é uma das minhas.
Você é o gelo na barriga... e o batom dos meus lábios
é o meu esforço pra continuar acordada, e a minha vontade de te ver dormir.
Você é meu porre, minha ressaca, mas principalmente o meu delírio.
Você é minha miragem nesse deserto eterno, é uma cabana na floresta fria.
É madeira quente, com cheiro forte e lento no meu lençol
Quero sorrir tua alegria e beijar suas lágrimas
Quero te vestir assim como vestes a tinta da tua pele.

Romance em 12 linhas

Quanto tempo falta pra gente se ver hoje?
Quanto tempo falta pra gente se ver logo?
Quanto tempo falta pra gente se ver todo dia?
Quanto tempo falta pra gente se ver sempre?
Quanto tempo falta pra gente se ver dia sim dia não?
Quanto tempo falta pra gente se ver às vezes?
Quanto tempo falta pra gente se ver cada vez menos?
Quanto tempo falta pra gente não querer se ver?
Quanto tempo falta pra gente não querer se ver nunca mais?
Quanto tempo falta pra gente se ver e fingir que não se viu?
Quanto tempo falta pra gente se ver e não se reconhecer?

Quanto tempo falta pra gente se ver e nem lembrar que um dia se conheceu?

Chove na lua

A minha mente apaga pedaços do tempo
Para que eu possa seguir em frente livre da moldura de cobre que agarra as memórias
E a vida da gente passa de repente,  esbarrando em rastros de aromas que estão sempre suspensos no ar
Mas quando chega a chuva, o vento empurra pra debaixo da pele as explicações esfoladas da alma... sentimentos ja incinerados voltam a aquecer as pontas dos dedos, o coração pesa dentro do peito, e nem todo o tempo nem todo o vento do mundo é capaz de tirar de mim o fantasma do seu beijo
Seu veneno doce correndo lentamente em minhas veias me faz sentir viva.