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segunda-feira, 14 de maio de 2012

A ultima estação do trem (Cap 6)

Cartas à meu irmão






15 de maio
 Eu não durmo à algumas noites. O rivotril já não me apaga e a fluxotina não me alegra. Dilata minhas pupilas, mas não flui. Não é falta de eficácia psicotrópica, nem intolerância. É uma saudade desbotada. Me falta algo. Seu vocabulário sujo, seus palavrões pronunciados errados. Me falta o soco forte no braço quando eu dizia algo absurdo. Me falta sua cara de merda ao me ver bêbada.
 A verdade é que não sou tão forte quanto você pensa que eu sou, Lucas. Na verdade eu sou fraca e fraca pra caralho, eu só era forte quando você estava por perto.
 Triste mesmo é perceber que de repente meus porres são lúcidos, meu quarto vazio e já não existe hematomas no meu braço. Não tenho a certeza constante de como você está, e a cobaia das minhas experiências culinárias está distante.
 Aonde você está agora? são 02:42... Comendo alguma puta da qual não vou poder te zuar amanhã? Que vontade insana de gritar até você aparecer bem aqui, na poltrona cor de vinho que ainda tem seus rabiscos, segurando minha mão e dizendo pra calar a boca. Vontade de engolir seco o resto das minhas cartelas de comprimido só pra ver se você aparece e me chuta até eu acordar.
 É que eu já tentei tudo, maninho. Fiz o bolo de carne que você gosta, salguei menos o camarão, lavei a mão a camiseta do "laranja mecânica", fiquei sem engraxar o coturno por semanas, passei silenciosamente na praça José Bonifácio olhando sempre pra esquerda, fui sozinha à noite na praça da boys, comprei duas garrafas de chalise, comprei uma barra de diamante negro que não consegui engolir nem cuspir fora, tentei Johnny Cash, Paulo coelho, A bruxa de portobello, o alquimista, diário de um mago, brida, veronika decides to die. Tentei bilhar, cocaína, blues...  Adotei mais um gato, tentei conhaque presidente e vomitei tudo mas a nescessidade de te agarrar bem forte pelas orelhas e vomitar toda a falta que você me faz ainda não passou.
 Então não fique triste se eu contar que tenho mesmo essa vontade insana de tomar todos esses calmantes, por que assim quem sabe eu durmo, quem sabe eu tenho um sonho bem bonito com você. Eu queria mesmo que fosse um sonho, e eu acordasse contigo jogando as chaves da chopperia na minha cara.
  Tentei alguns comprimidos de metadona pra ver se passa. Não passa. Uma semana que você não liga, não me escreve e me resta essa coisa morna de ficar choramingando pelos cantos o quanto você me faz falta e todas as madrugadas vazias tãããão cheias de nós e vá pra puta que pariu com essa sua idéia de que você precisa correr atraz dos seus sonhos e grande porcaria isso tudo! Essa não é uma carta bonita pra você, nem mais um relato do meu amor cinzento. É uma carta onde eu cuspi tudo o que tava entalado aqui no fundo, a verdade é que o tempo não para, é só essa saudade filha da puta que faz as coisas pararem no tempo.
 E nesse inverno a tua foto no vidro da minha janela me lembra as roupas de verão que estão dobradas no fundo das gavetas, por que bem sei que não vou poder usa-las por um longo tempo, mas guardo por que gosto delas, mas guardo por que acredito que o verão há de vir. A verdade é que eu sou só metade.
 Com muita raiva, sua irmã.






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